SÃO PAULO, SP (FOLHAPRESS) — Os beneficiários do Auxílio Brasil que contratarem o crédito consignado e perderem o benefício terão de arcar com a dívida até o final do contrato. Se houver atraso, pagarão multa e juros.
A regra, que está em normativa publicada no final de setembro, não tem ficado tão clara para quem busca o crédito. Muitos acreditam que a dívida é perdoada ou ficaria para o governo.
Embora os sites da Caixa Econômica Federal — maior banco a oferecer o empréstimo — e do Ministério da Cidadania contenham a informação, ela não está na página inicial. Para saber os detalhes, o cidadão precisa buscar em perguntas e respostas.
Para Ione Amorim, coordenadora do programa de serviços financeiros do Idec (Instituto Brasileiro de Defesa do Consumidor), falta transparência. Em levantamento feito pelo instituto com mais de 2.000 reclamações após analisar 9.000 comentários em dez canais que tratam sobre finanças online, a falta de transparência era um dos problemas.
"Eu diria que as informações estão muito protocolares, não têm caráter de trazer transparência e orientar o consumidor. Isso acontece em todas as etapas. A maioria está contratando o valor máximo, às cegas. Muitas acham que nem vão precisar pagar", afirma ela.
O consignado do Auxílio Brasil passou a ser oferecido no início de outubro. Os juros são limitados a 3,5% ao mês, o que dá 51,11% ao ano, acima da taxa cobrada no consignado dos aposentados do INSS (Instituto Nacional do Seguro Social), de 2,14% ao mês. Na Caixa a taxa é de 3,45% ao mês.
É possível emprestar até R$ 2.569,34, em 24 vezes, comprometendo até 40% do benefício. O valor máximo mensal a ser pago é de R$ 160, considerando o valor-base do auxílio, que é de R$ 400 — os R$ 600 são temporários, somente até dezembro. As parcelas são descontadas diretamente do benefício.
Considerando os R$ 600 atuais, resta ao beneficiário R$ 440 por mês. Se o auxílio voltar a R$ 400, restarão R$ 240. "Pouca gente faz essa conta, de que vai ter que pagar. Para mim, [o empréstimo] não compensa, porque ficaria uma dívida", diz Dyane Ayala, 40 anos, beneficiário do Auxílio Brasil.
Ela afirma que, no bairro onde mora, no extremo leste da capital paulista, houve muito debate sobre como ficaria a dívida se o auxílio fosse cortado. Com isso, a maioria optou por não contratar e só uma pessoa que ela conhece teria feito o empréstimo. O restante não quer receber valor menor por mês se fizer o consignado.
O QUE SE SABE SOBRE A DÍVIDA DO EMPRÉSTIMO
No site do Ministério da Cidadania, a informação é de que será necessário pagar os valores até o final do contrato. O órgão orienta o cidadão a buscar informações no banco em que contratou o crédito.
No site da Caixa, há mais detalhes. "Como qualquer outro empréstimo, é necessário pagá-lo, já que o valor emprestado foi recebido. Caso não seja feito o pagamento até a data do vencimento, a dívida aumenta com o passar do tempo, pois tem juros e multa pelo atraso. Por isso, o quanto antes regularizar a dívida, menos vai pagar por ela."
Segundo o banco, para quem tiver a conta encerrada, será emitido um boleto de pagamento. Além disso, o beneficiário que deixa de pagar um débito terá mais dificuldades em conseguir crédito futuro.
Na contratação, segundo as regras dos empréstimos, bancos e financeiras precisam disponibilizar um questionário ao beneficiário, a ser respondido por ele, como uma das etapas de contratação.
Dentre as informações está a frase: "Você não pode deixar de pagar as prestações ou descumprir as regras até que o contrato desse empréstimo termine ou você pague toda a dívida."
Para Ione, no entanto, isso não é o suficiente. Ela afirma que bancos e financeiras estão oferecendo o limite maior do crédito, sem dar opção de valores mais baixos, com prestações menores, além de denúncias de venda casada, com seguro para as prestações. "Como oferecer seguro para as prestações, se elas são descontadas diretamente do benefício?", questiona.
A coordenadora volta a afirmar não ser contra o crédito, mas diz que há riscos para essa população. "Entendemos que as pessoas têm necessidades, mas quando a gente faz o alerta sobre os riscos é porque é uma população que, além de vulnerável, tem pouca familiaridade com essas regras de crédito", afirma.
VEJA AS REGRAS AO CONTRATAR O CONSIGNADO DO AUXÍLIO BRASIL
· Os bancos e financeiras devem informar, no contrato:
· Valor total com e sem juros
· Taxa de juros efetiva mensal e anual
· Outras taxas que incidirem sobre o crédito
· Valor e total de prestações
· Quanto o beneficiário irá pagar ao final
· Data de início e fim do desconto
· Valor líquido do benefício com o crédito
· CNPJ da agência ou do correspondente bancário, além de CPF do agente, com endereço e telefone
· Valor da comissão paga aos terceirizados